segunda-feira, 9 de julho de 2018

A máquina e a emoção: desejos e Lua


O ser humano individualizado vive sua vida de acordo com as experiências que tem, isto é, é capaz de fazer escolhas, e ser responsável pelas consequências, ele se conscientiza de seu lugar no tempo da experiência. Aqui nessa esfera não englobo a humanidade inteira, pois existem diferentes níveis de  evolução humana. Mas a nossa sociedade ocidental é em sua maioria formada por seres individualizados, que se reconhecem enquanto sujeitos de suas histórias de vidas, logo se responsabilizam, ou não. A esfera que ainda não se individualizou, está geralmente integrada em sistemas sociais onde a ordem de um grupo se sobressai ao indivíduo, assim são as comunidades tribais que ainda se fundam em castas. “É privilégio do homem individualizar-se e destacar-se do rebanho, da tribo, da comunidade sócio-religiosa em que nasceu. É privilégio do homem sentir-se “separado” como um “eu”, um ego que tem características ímpares. Esse é seu privilégio e esse é seu fardo trágico, ou sua responsabilidade. Isso faz dele um deus ou um demônio.” (Dane Rudhyar)
Esse privilégio da espécie humana, essa individuação de que já falava o astrólogo Dane Rudhyar, no seu aspecto trágico cria redes de bloqueios e prisões emocionais, ora, não esqueçamos que este indivíduo que saltou fora da manada, há fez em um meio social, mais amplo, dando origem ao homem moderno e sua cultura capitalista, esse ser individual necessita de alguma forma se adequar para ser absorvido pela experiência moderna, esse fato se iniciou por volta do século XIX.
É comum deixar para depois às necessidades profundas pra atendermos aos desejos efêmeros do ego que surgem em ondas regidas pelo momento, são “ondas consumistas”, que tem um investimento midiático/psicológico forte para manter os desejos e capitais acesos. Atente que é diferente viver o agora e viver para satisfazer os desejos do agora, para viver o agora basta estarmos presente no que estamos fazendo, atentos, por assim dizer em estado de meditação, relaxados, seja lavando uma louça, ou administrando uma multinacional, aqui temos nossa individualidade integrada dentro do universo holístico, no segundo caso, quando estamos envolvidos em satisfazer os desejos que emergem, vivemos como analisa os filósofos Deleuze e Guattari , tal qual “máquinas desejantes” isto é, num sistema de interferências, de engrenagens ou rizomas, que ligam indivíduos e sociedade, em outro ponto temos Foucault, que nos empresta sua visão acerca da modernidade e da complexidade que o poder exerce sobre os indivíduos ao controlar politicamente e moralmente corpos (Foucault) e desejos (Deleuze e Guatarri). As vidas individuais quando transformadas em máquinas desejantes estão submetidas à máquina estatal/econômica capitalista, não somos mais um “Eu” de desejos próprios ou de anti-desejos, mas um produto ou máquina desse tempo, no qual mecanismos de poderes nos atravessam, desde a família (casa 4), às parcerias (casa 7) e o cume do sucesso ou fracasso social (casa 10).
Quando ficamos limitados ao capitalismo nossos desejos não são somente de foro íntimo, eles são construídos por meio dos estímulos externos, das vivências com o meio, assim desejos são construídos e inventados dentro das individualidades que irão reprimi-los ou não, e no entanto seja qual for a escolha ela estará imbuída em capital e isso forjará uma escala de valores dentro do sistema das máquinas desejantes, na qual culpabilizações ou gestos hedonistas se criam em escala crescente, onde lucram desde as psiquiatrias até lojas de suvenires.
O Estado nega o poder de vida ou de morte à decisão do sujeito, a doença e a saúde são ferramentas institucionais e produtoras de lucro, a subjetivação capitalística destes fatores da vida, entram em conflito com nossa natureza, o capitalismo tem o dom de nos deixar perplexos com nossa humanidade e de uma forma demasiado infantilizados, sedentos por prazer instantâneo, para talvez mascarar a dor das enfermidades humanas no mundo, e não pensar profundamente como cada ser se tornou coautor da realidade mundial tal qual é, tendo o poder financeiro como centro de comando e decisões que concerne a vidas e suas ações. Transformamos em tabus a sexualidade e suas variadas formas de expressão (casa 8), compartimentando um mundo de significados e significantes de natureza profunda, vital, em máquinas com suas peças bem separadas e ordenadas tal como as peças erotizadas, sensualizadas, pornográficas, disfuncionais e patológicas, normas de um sexo saudável e normatizado numa visão reducionista de heterossexualismo, ditames de uma conduta pautada numa moral de matriz cristã no qual se impregnou no corpo uma sensação de culpa ao se permitir prazer e mais nada, ou a  negação dele, ou ainda o que sai da matriz cartesiana da heteronormatividade pode cair com facilidade nas malhas dos fomentadores de patologias e suas diversas neuroses. 
Para mantermos as engrenagens dessas máquinas foi necessário que os conflitos, as vontades e potencias fossem relegados ao ostracismo interno (subconsciente / casa 12), aqui surge o terreno fértil para emergirem os bloqueios e as prisões emocionais, ora, máquinas desejantes são os “corpos sem órgãos” de Deleuze e Guattari  e aqui os sentimentos e emocionalismos são transformados em produtos do capital, ou seja, doenças e transtornos que a psiquiatria ou as religiões tendem a resolver, intermediando sujeitos com uma ordem que tem o poder de cura ou de escolha.
A autonomia individual só é possível quando nos damos conta desses emaranhados sociais que nos envolvem, e que nos fazem querer, desejar, assim atuando na manutenção do status quo, mesmo que de forma inconsciente. A Lua astrológica não se agrada de forma alguma com esse quadro, então se frustra, retêm energia afetuosa e nutridora, assim os caminhos para relações saudáveis se veem bloqueados, dando margem à estagnação. Essas máquinas desejantes ou esses corpos bloqueados, criam para si (casa 1) e para o grupo (casa 11), estruturas de dependência, desde a infância, quando a criança se esforça para ser aceita e amada, primeiro pela família (casa 4) e depois pelo entorno (casa 3), seu desenvolvimento criativo (casa 5) pode precisar de escape, e o sistema capitalista lhes servirá com diversões, prazeres que envolvam riscos, o uso de drogas, do álcool, as recreações artificiais promotoras de prazeres.
A consciência dessas estruturas sociais e suas relações astrais nos permitem ir ao encontro desse emocional reprimido, por satisfazer o ego pessoal, quando em relação ao ego social ou super ego. Aqui há uma fissura, um quase vácuo, mas criador de uma obscuridade ou sombra, que a Lua sente, introjeta, mascara e devolve ao exterior por meio de síndromes, complexos, vícios e conflitos. Essa carência emocional afeta nossa noção de valor (Vênus / Casa 2), pois as águas emocionais represadas encontram afinidade com valores negativos e atuais da cultura e da moral capitalista, atuam em dramas, encontram o pecado da culpa e o sentimento da vergonha, e muitas vezes quando identificados não conseguem ser expressos e invadem o ser e vão minando-o de dentro para fora e de fora para dentro. Uma espécie de sístole-diástole socioindividual.
Assim, trago essa reflexão para irmos ao canto escuro da alma, que só uma Lua iluminada de Sol é capaz de encarar, deixando às máscaras sociais para lá. Uma leitura astral é uma possibilidade de encontro com o humano em nós. As máquinas da engrenagem precisam de um coração, de água, de Lua e de emoção fluindo. Para isso é quase certo que iremos à margem do status quo, coragem, afeto e companheiros de caminho são importantes nesse despertar das máquinas. Então, vamos destravar essa represa presa no peito? Chamo de amor.



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